CAPACITISMO: a Invisível Barreira que Precisamos Derrubar
O verdadeiro obstáculo não está na deficiência, mas nas barreiras que a sociedade insiste em manter (Retina Brasil, 2024)
Capacitismo é a discriminação e o preconceito contra pessoas com deficiência, que se baseia na ideia de que corpos e mentes considerados normais são superiores e mais válidos. Esse conceito reforça barreiras sociais e estruturais que dificultam a inclusão e a autonomia das pessoas com deficiência. Essa forma de opressão pode se manifestar de várias maneiras, desde atitudes negativas e estigmatizantes até estruturas sociais que marginalizam as pessoas com deficiência.
Victor Di Marco (2020), diz que o capacitismo não é apenas um preconceito individual, mas um sistema estrutural que define quem pode ou não participar plenamente da sociedade. Isso se reflete em leis, políticas públicas, educação, mercado de trabalho, acessibilidade e no próprio discurso social.
O capacitismo perpetua a exclusão social e impede que pessoas com deficiência tenham acesso a oportunidades iguais em diversas áreas, como educação, trabalho, saúde e lazer. Combater o capacitismo é fundamental para promover a inclusão, o respeito e a dignidade de todas as pessoas, independentemente de suas habilidades ou limitações.
Sim. O capacitismo é considerado crime de discriminação contra pessoa com deficiência, conforme o artigo 88 da LBI, que estabelece penalidades para condutas discriminatórias:
A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) – Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, garante que pessoas com deficiência não podem ser excluídas ou tratadas de forma desigual em nenhum contexto, como educação, trabalho, saúde e lazer.
Art. 88 – Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência:
Pena: reclusão de 1 a 3 anos e multa.
Se a discriminação ocorrer em meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: Pena de 2 a 5 anos e multa.
A lei não usa a palavra “capacitismo”, mas define a discriminação como “toda forma de distinção, restrição ou exclusão baseada na deficiência que tenha o efeito de impedir ou prejudicar o reconhecimento ou exercício de direitos” (Art. 4º, §1º).
Qualquer atitude que exclua, inferiorize ou crie barreiras para pessoas com deficiência pode ser classificada como discriminação e, consequentemente, como crime. O capacitismo, quando se manifesta como discriminação, pode ser punido com base na Lei Brasileira de Inclusão (LBI). Embora o termo “capacitismo” não esteja explicitamente mencionado na legislação, as condutas capacitistas que restringem direitos são consideradas ilícitas e, portanto, passíveis de penalização.
O capacitismo pode se manifestar de diversas formas no dia a dia, muitas vezes de maneira sutil. Veja alguns dos principais tipos:
Presente nas instituições e na sociedade como um todo, esse tipo de capacitismo se reflete na falta de acessibilidade em espaços públicos, no mercado de trabalho, na educação e nos serviços básicos. Exemplo: ausência de rampas e pisos táteis em prédios públicos.
Evitar – “Ah, não tem rampa, mas é só alguém carregar a cadeira de rodas.”
Correto – “Esse espaço precisa ser acessível. Como podemos garantir a rampa?”
Por quê? Acessibilidade não é um favor, é um direito. Carregar alguém não resolve o problema e ainda reforça a dependência.
São crenças e comportamentos que reforçam a inferiorização da pessoa com deficiência. Exemplo: falar com um adulto com deficiência como se fosse uma criança ou presumir que ele não pode tomar decisões sobre sua própria vida.
Evitar – (Para um adulto com deficiência) “Que bonitinho! Você está tão bem para alguém na sua condição!”
Correto – “Oi, prazer em conhecê-lo(a). Em que posso ajudar?”
Por quê? Pessoas com deficiência são adultos como qualquer outro e devem ser tratadas com respeito e sem infantilização.
Uso de expressões que reforçam estereótipos negativos ou reduzem a identidade da pessoa à sua deficiência. Exemplo: dizer que alguém “sofre de deficiência” ou que é “um exemplo de superação” apenas por viver sua vida cotidiana.
Evitar – “Vamos fazer uma dinâmica, mas não sei se você vai conseguir participar…”
Correto – “Vamos fazer uma dinâmica. Precisa de alguma adaptação para participar?”
Por quê? Presumir a incapacidade da pessoa exclui sua participação. Perguntar sobre necessidades de adaptação mostra respeito e inclusão.
Visão da deficiência apenas como uma condição a ser “corrigida” ou “curada”, ignorando o direito das pessoas com deficiência de serem valorizadas como são.
Evitar – “Coitado, ele sofre de deficiência visual.”
Correto – “Ele é uma pessoa com deficiência visual.”
Por quê? A deficiência não é um sofrimento constante. A forma correta é mencionar a pessoa antes da deficiência (linguagem de preferência da maioria das comunidades PCD).
O capacitismo recreativo refere-se a piadas e brincadeiras de mau gosto que abordam deficiências de maneira desrespeitosa.
Evitar – “fingir demência”
Correto – “fingir não entender” ou “fingir desinteresse”.
Por quê? Expressões como ”fingir demência” usam a deficiência como algo negativo, o que reforça ou promove estereótipos.
Quando alguém trata pessoas com deficiência com excesso de piedade ou admiração exagerada por atividades comuns, reforçando a ideia de que elas são frágeis ou incapazes.
Evitar – “Nossa, você é uma inspiração só por sair de casa!”
Correto – “Que bom te ver aqui! Como tem passado?”
Por quê? Tratar pessoas com deficiência como “heróis” apenas por realizarem atividades comuns reforça a ideia de que suas vidas são trágicas ou inferiores.
No ambiente de trabalho, o capacitismo é o questionamento da capacidade profissional de uma pessoa.
Evitar – “Você não pode assumir esse projeto, pois pessoas com deficiência geralmente não conseguem lidar bem com pressão.”
Correto – “Você tem habilidades únicas que podem trazer uma nova perspectiva ao projeto, e sua capacidade de lidar com pressão é tão válida quanto a de qualquer outra pessoa.”
Por quê? Expressões anticapacitista ajudam a desafiar estereótipos e promovem a inclusão e valorização das habilidades de todas as pessoas, independentemente de suas condições.
O capacitismo institucional ocorre quando regras, políticas, práticas ou estruturas de instituições (como escolas, empresas, órgãos públicos, hospitais etc.) perpetuam a exclusão e desigualdade das pessoas com deficiência. Isso acontece, por exemplo, quando não há acessibilidade física e digital, quando barreiras burocráticas dificultam o acesso a direitos ou quando há falta de representação de pessoas com deficiência em cargos de liderança.
Evitar – “Não temos estrutura para contratar pessoas com deficiência.”
Correto – “Vamos garantir acessibilidade para contratar e integrar profissionais com deficiência em nossa empresa.”
Por quê? – Instituições têm um papel crucial de responsabilidade social na formação de valores e normas sociais. Ao eliminar a linguagem capacitistas, elas podem liderar pelo exemplo e promover uma sociedade mais justa e igualitária.
O capacitismo na educação se manifesta quando instituições, professores ou colegas consideram estudantes com deficiência incapazes, impõem barreiras ao aprendizado ou não asseguram acessibilidade. Isso abrange a recusa em adaptar materiais, a ausência de intérpretes de Libras, ambientes inacessíveis e a exclusão do aluno de atividades acadêmicas e sociais.
Evitar – “Esse aluno com deficiência não vai conseguir acompanhar a turma.”
Correto – “Vamos adaptar os materiais e estratégias para garantir que todos os alunos aprendam juntos.”
Por quê? – É fundamental combater frases capacitistas na educação, pois elas perpetuam estigmas e excluem estudantes com deficiência, limitando seu potencial. Promover um ambiente inclusivo é essencial para garantir igualdade de oportunidades de aprendizado para todos.
A melhor forma de evitar o capacitismo é ouvir as pessoas com deficiência e respeitar suas experiências e preferências.
• Conscientização: Promova discussões sobre deficiência e capacitismo em ambientes escolares, corporativos e comunitários.
• Formação Inclusiva: Capacite professores e funcionários a lidarem com a diversidade e promover a inclusão.
• Infraestrutura: Defenda e implemente melhorias na acessibilidade de espaços públicos e privados (rampas, sinalização tátil, banheiros acessíveis etc.).
• Tecnologia Assistiva: Promova o uso de tecnologias que ajudem a eliminar barreiras na comunicação e na mobilidade.
• Empoderamento: Apoie a inclusão de pessoas com deficiência em todos os campos, especialmente em cargos de liderança e na mídia.
• Visibilidade: Destaque produções artísticas e culturais que abordem a experiência de viver com deficiência.
• Escuta Ativa: Dê espaço para que pessoas com deficiência compartilhem suas experiências e necessidades.
• Respeito às Diferenças: Reconheça e valorize a diversidade como parte fundamental da sociedade.
• E para você? Cada pessoa pode contribuir para um ambiente mais inclusivo. Reflita sobre suas atitudes e busque entender o impacto do capacitismo em sua comunidade.
• Seja um Aliado: Apoie iniciativas que promovam a inclusão e denuncie atitudes capacitistas quando as presenciar.
O combate ao capacitismo é uma responsabilidade coletiva, pois os direitos humanos asseguram que todas as pessoas, independentemente de suas habilidades ou deficiências, tenham acesso a oportunidades iguais e tratamento justo. Isso abrange educação, emprego, saúde e mobilidade. Organizações como a ONU promovem a inclusão e a proteção dos direitos das pessoas com deficiência por meio de convenções, como a CDPD, que garante o exercício dos direitos em igualdade de condições. Ao fomentar a inclusão e o respeito, contribuímos para uma sociedade mais justa, onde todos podem viver com dignidade.
Referências
ASID BRASIL. E-Book. Inclusão e Diversidade. 2022. Acesso: 12/10/24.
BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 7 jul. 2015.
COSTA, L.S. et al. Combata o capacitismo: orientações para o respeito à diversidade humana. 2ª ed. Rio de janeiro: Fiocruz,2024.
DI MARCO, Victor. Capacitismo: o mito da capacidade. 1. ed. Belo Horizonte/MG: Letramento, 2020.